Fiz esse passeio às vinícolas na região do Douro em um domingo, 22 de janeiro de 2017. Um passeio que me envolveu das 9h às 20h45 daquele dia. Eu havia agendado esse tour, principalmente com a companhia Quinta do Seixo por e-mail, com cerca de um mês de antecedência, conforme mencionei – isso porque eu achei que talvez o tour fosse muito disputado, por conta da fama da marca Sandeman. Eu comprei o ticket para um trem na linda estação do Porto, a São Bento, que já é um atrativo à parte. Duas horas depois, cheguei à Peso da Régua, uma agradável cidadezinha, onde está o Museu do Douro, que conta tudo sobre o aclamado vinho produzido nessa região. Há de tudo no museu: rótulos de vinhos, produção, época de colheita, tradições populares etc. Eles terminam a visita com a degustação de uma taça de vinho do Porto.
Os rótulos de vinhos do Porto em uma sala específica do museu são um atrativo a parte:
Há uma rua em Peso da Régua em homenagem ao barão de Forrester, um inglês que se radicou em Portugal é que se tornou um conhecido empresário de vinhos no país.
De lá segui à Quinta do Seixo, onde é produzido o excelente vinho Sandeman. Esse é um vinho que desperta em mim uma grande memória afetiva. Meu pai adorava vinhos – franceses, italianos e alemães principalmente – mas ele tinha um forte interesse também pelos vinhos de Portugal, sobretudo Vinho do Porto. E Sandeman era um que estava sempre na minha casa e me traz muitas recordações do meu pai.
A minha degustação incluiu a prova de 5 vinhos do Porto. Foi a degustação chamada VAU Vintage. Deu para ficar um pouco “alegre” ao provar tantos vinhos 😉
O Douro foi uma das primeiras regiões vinícolas do mundo a ser demarcada, em 1756. A história do Sandeman se inicia com um escocês chamado George Sandeman, que fundou um negócio de vinhos em Londres. Com um empréstimo de £ 300 comprou sua primeira adega e iniciou sua atividade no Porto. Em 1795, ele havia estabelecido uma agência em Cádiz, na Espanha e em 1811 ele comprou uma adega de envelhecimento em Vila Nova de Gaia, em Portugal, vizinha à cidade do Porto.
No começo de 1800, os vinhos Sandeman foram enviados a países da Europa e América do Sul, África, Ásia e até Nova Zelândia. O Vinho do Porto é sempre uma mistura, não sendo produzida a partir de uma única variedade de uva. A fermentação, uma reação natural que transforma o açúcar das uvas em álcool, é interrompida antes de seu fim com a adição de uma aguardente vínica neutra, resultando em um vinho rico, encorpado, com alto teor de açúcar residual e um teor alcoólico de 20%.
Após essa perfeita experiência, fui a outra cidade, Pinhão, para conferir a estação de trem deles repleta de azulejos. Mais uma bela cidade. De lá voltei a Peso da Régua e peguei novamente o trem para Porto.
E aqui dá pra ver a forte presença e influência inglesa na história da produção vinícola de Portugal e principalmente nessa região. Embora o vinho do Porto não seja invenção inglesa, eles viram uma oportunidade de lucrar com esse negócio. Vários vinhos do Porto tem nome inglês, passado inglês, revelando a influência inglesa na trajetória econômica de Portugal, um pouco mais atrasada quando comparada a outros países europeus.
O ouro do Brasil fornecido a Portugal durante o período colonial beneficiou na verdade não a Portugal, mas ao Império Britânico, influenciando no estabelecimento do principal sistema bancário na Europa e na Revolução Industrial. Isso foi por causa do Tratado de Methuen (Tratado Português de Panos e Vinhos) assinado entre Portugal e Inglaterra em 1703. De acordo com este tratado comercial, Portugal deveria comprar tecidos ingleses e em troca a Inglaterra compraria os vinhos produzidos por Portugal. O ouro do Brasil não resultou em uma recuperação econômica para os portugueses e, pior, essa extração de ouro, reforçou a dependência econômica portuguesa do Brasil. Ao longo do tempo, o Tratado de Methuen impeliu muitos produtores rurais portugueses a utilizar grandes quantidades de solo fértil lusitano para a produção de vinho – uma prática que não permitia o desenvolvimento de Portugal relacionada com outras atividades capazes de dinamizar a sua economia.
A demanda portuguesa por tecidos ingleses foi muito superior aos lucros obtidos com a venda de vinho para a Inglaterra. Como resultado, os portugueses acumularam dívidas enormes devido à crescente necessidade de consumir produtos ingleses. O ouro do Brasil na era colonial ironicamente quase destruiu a economia portuguesa a um ponto que nunca mais se recuperou (quando comparado a outros países na Europa central). A atividade foi vantajosa para o Brasil, trazendo desenvolvimento às regiões auríferas, particularmente ao que hoje corresponde ao Estado de Minas Gerais e também foi ainda mais vantajosa para a Inglaterra, que evoluiu sua indústria com maior produção e demanda por suas manufaturas – o que não aconteceu em Portugal, uma vez que os mecanismos para a produção de vinho são simples, quase artesanais, não exigindo um grande desenvolvimento.
Essa moça que fez a visita guiada pela Sandeman confirmou isso que eu escrevi – se bem que eu confesso que, como falo demais, 😉 não dei muita chance a ela de explicar (mas após o vídeo ela continuou a abordar os aspectos históricos). Eu super recomendo conhecer essa ou outra empresa de vinhos do Porto e fazer uma visita guiada. A da Sandeman é de alta qualidade. Eu adorei.
Mas já que lá estive, pude aproveitar todo o lado bom que o Capitalismo tem a me oferecer. ^_~
Obrigada, Methuen Treaty!
Um comentário sobre “Visita à Sandeman e degustação de vinhos – Trás-os-Montes e Alto Douro (Norte de Portugal)”